Tuesday, October 15, 2013

Anne Sexton, mulher, útero, confissão*

*texto de antonio la carne, correspondente do vodca em vênus, em que ele apresenta uma de suas poetas favoritas.

Quando eu era adolescente, lembro de ter lido uma entrevista da Madonna em que ela citava suas poetas favoritas. Como todo fã obsessivo, fui pesquisar quem era a tal Anne Sexton, e simplesmente fui fisgado. Eu não pude acreditar que existia uma mulher no mundo capaz de arquitetar tão bem as mazelas do espírito sem um pingo de pudor.

Na literatura, os meus favoritos são os desajustados, os que fogem do modelo de conduta, os que arriscam, os descontentes. Anne sempre fora um canhão prestes a explodir. Ela sofria, era linda, tinha amantes (um deles foi seu próprio analista). Ela também exagerou na bebida, no glamour, no desespero, no amor e na repulsa pelas próprias filhas. Anne é uma espécie de realidade filha da puta estampada nas fuças. A constatação de que a verdade pessoal é o que nos rege, independente da opinião babaca alheia.

Ela nasceu em 1928 nos Estados Unidos e foi um dos ícones femininos da poesia confessional. Após o nascimento de suas duas filhas, apresentou quadros de depressão pós-parto (enfermidade até então “incomum” em plena década de 50).

Com sucessivos transtornos mentais e internações em clínicas psiquiátricas, foi aconselhada por seu terapeuta a se expressar através da escrita. Até então, Anne era apenas uma dona de casa suburbana e frustrada pelo vazio barra pesada que todos nós, pobres mortais, somos vítimas.

Anne arrasou com os padrões literários dos anos 60, deixou todo mundo de queixo caído ao lançar seu primeiro livro: “To Bedlam and Part Way Back”.

No livro e em toda a sua obra, Anne abordou temas polêmicos como adultério, menstruação, suicídio, aborto, sexo, depressão, automedicação, masturbação, homossexualidade, abuso sexual e celebração do corpo feminino – como no poema “In Celebration of My Uterus”.

Os críticos ficaram passados com tamanho talento e ousadia. Cada sensação, dor e inferno pessoal eram descritos num poema, como se a única maneira de dar sentido a esse sofrimento fosse comunicá-lo aos outros.

Anne ficou famosa e em 1967 ganhou o Pulitzer por seu terceiro livro “Live or Die”.

O mais incrível na poesia de Anne é que cada palavra soa como uma válvula de escape, um tiro no escuro sob a perspectiva feminina, que, independente do gênero, se torna universal.

Um mês antes de completar 46 anos, em outubro de 1974, ela cometeu suicido ao se trancar na garagem de sua casa. Ligou o carro e morreu envenenada pelo monóxido de carbono do motor.

Anne Sexton foi visionária, e sua última tentativa de salvação foi mergulhar no desconhecido da morte.

Como um descontrolado súdito da poesia de Anne, por várias vezes me vejo recitando algum de seus poemas nas minhas noites ao Deus-dará – principalmente quando os boys da vida arrasam com o meu coração ou quando me sinto a pessoa mais subestimada do mundo e etc.

É como ela disse um dia: “Put your ear close to your soul and listen hard”.

Tô tentando, Anne. Tô tentando.



"eu posso explicar o sexo"

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